segunda-feira, 8 de abril de 2013

A neurobiologia da maconha.

Sendo o cérebro tão vasto e complexo e a ação dos canabinóides tão diversa, não é de estranhar que a maconha produza efeitos variáveis no tempo, entre indivíduos e em diferentes contextos comportamentais.



Embora muitos efeitos mentais da Cannabis sejam conhecidos, seus mecanismos de ação no cérebro ainda guardam segredos. Evidências recentes, no entanto, mostram que os canabinóides produzem uma desorganização do ritmo cerebral, principalmente no hipocampo, área relacionada à formação de memória.

Registrando a atividade de dezenas de neurônios por meio de finíssimos fios metálicos conectados a amplificadores, neurofisiologistas húngaros e americanos da Universidade Rutgers em Newark, Estados Unidos, investigaram o efeito de canabinóides naturais e sintéticos na atividade neural e no comportamento de ratos enquanto estes realizavam uma tarefa de alternância espacial.

Os animais tinham de buscar recompensa em lugares que mudam com o tempo conforme uma ordem fixa. Isto exigia que eles se lembrassem da última escolha que fizeram, algo que depende da integridade do hipocampo. Os pesquisadores verificaram que os canabinóides produzem redução na potência dos ritmos hipocampais em diversas faixas de freqüência, efeito que puderam reverter utilizando um antagonista do receptor CB1, isto é, uma droga que bloqueia a ação dos canabinóides neste receptor.
A redução do ritmo hipocampal denominado teta, caracterizado por oscilações neurais numa faixa estreita de freqüências entre 4 e 12 Hz, correlacionou-se diretamente com os déficits de memória de trabalho. Quando os pesquisadores compararam a atividade de neurônios individuais antes e depois da administração dos canabinóides, verificaram que o tratamento teve apenas um leve impacto na freqüência com a qual potenciais de ação ocorrem em neurônios excitatórios e inibitórios. Entretanto, uma análise de coordenação temporal (sincronização) da atividade de grupos neuronais deixou claro que a sincronia da ocorrência de potenciais de ação de neurônios individuais é fortemente diminuída pelos canabinóides, literalmente desorganizando o processamento de informações no hipocampo.

Sendo o cérebro tão vasto e complexo, a ação dos canabinóides tão diversa e a interação com seus receptores canabinóides tão diferenciada, variando conforme a região cerebral enfocada e a dose utilizada, não é de estranhar que a maconha, que contém 70 canabinóides com propriedades distintas, produza efeitos muito variáveis no tempo, entre indivíduos e em diferentes contextos comportamentais.

As diversas funções reguladas por endocanabinóides derivam do funcionamento articulado de redes complementares de neurônios excitatórios e inibitórios, promovendo ação e contra-ação em níveis escalonados tanto molecular quanto sistêmico. Em contraste com essa precisa regulação temporal e localizada da ativação de receptores CB1, o consumo de maconha provoca diminuição generalizada da sincronia das populações de neurônios que integram os sistemas cerebrais com alta densidade de receptores canabinóides, como o hipocampo e o estriado.

Dado o alto grau de conexão destas regiões com o resto do cérebro, pode se dizer que a maconha produz uma reestruturação global dos padrões de atividade neuronal. A ação antiepilética, os déficits de memória de curto prazo, a alteração perceptiva que converte até os estímulos mais corriqueiros em novidade, a perda de atenção, a sensação alterada da passagem do tempo, a preguiça, o aumento da criatividade e da atitude contemplativa, todos esses efeitos mentais tipicamente causados pela maconha talvez derivem diretamente da flexibilização da coordenação entre grupos neuronais.

Fonte: http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/a_neurobiologia_da_maconha.html

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