segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Férias: entre a aventura e o descanso.

Viajar pode nos ajudar a encontrar o equilíbrio entre a alienação e a segurança.



“Durante 11 meses, devemos viver, no 12o, desejamos viver: nossas existências prosaicas anseiam, uma vez por ano, uma vida poética.” Com essas palavras, o escritor alemão Theodor Fontane (1819-1898) zombava da mania de viajar de seus contemporâneos. Tirar férias para compensar a banalidade cotidiana? Talvez. “Nosso instinto errante e vagabundo é principalmente paixão, erotismo.

Assim como optamos por determinado estilo de roupa, escolhemos entre as diversas formas de passar as férias de acordo com o prestígio que oferecem determinados destinos, constata o sociólogo Gerhard Schulze. Mas se perguntarmos a quem está partindo o que espera da viagem, a maioria responde simplesmente: relaxar. Outros tantos dizem querer acumular novas energias, fugir da rotina, ter maior contato com a natureza ou apenas se divertir. É curioso que, até agora, os efeitos benéficos de viajar tenham sido pouco estudados do ponto de vista científico. Para a nossa espécie, o ímpeto de viajar não é artificial. De fato, o Homo sapiens viajou a maior parte de sua existência, e há alguns milhares de anos certas populações do neolítico tornaram-se nômades.

O psicólogo ambiental Roger S. Ulrich, da Universidade do Texas, também aponta a importância da história evolutiva. Os resultados de suas pesquisas sugerem qual deveria ser a meta de uma viagem repousante. Em 1987, esse psicólogo suscitou certo alvoroço ao publicar, na revista Science, um estudo sobre pessoas operadas de cálculo biliar: os pacientes que podiam contemplar, de seus leitos, uma paisagem verdejante, recuperavam-se mais rapidamente que outros em condições clínicas idênticas, mas cujo panorama visual era limitado a uma parede de tijolos. Uma série sucessiva de experimentos levou Ulrich a concluir que a amenidade de uma paisagem natural tranqüiliza o homem moderno porque no tempo de nossos ancestrais era sinônimo de alimento e segurança.

Mas a ação positiva das férias sobre a psique vai bem além do efeito antiestresse. Para pesquisar os fatores de bem-estar válidos em geral para quem viaja, Bettina Graf comparou dois tipos de turista que não poderiam ser mais distintos: os turistas solitários de mochila nas costas (os globetrotter ou mochileiros), que vagam por terras longínquas sem destino preciso, e os aficionados pelo trailer, que todos os anos passam as férias em um acampamento (e, freqüentemente, sempre no mesmo). É de supor que os motivos pelos quais os dois grupos viajam sejam bastante diferentes. Mas em que sentido?

A psicologia ambiental sugere uma hipótese. Essa disciplina parte do pressuposto de que o ambiente é uma fonte de estímulo que, regulada pela formação reticular do tronco do encéfalo, ativa o córtex cerebral e o coloca em um determinado estado de excitação interior, cujo espectro vai do sono a uma grande agitação; em geral, nos sentimos mais confortáveis em um grau de excitação intermediário. Nossas ações surgem, assim, da necessidade de manter o nível de excitação que preferimos. Portanto, se estamos estressados, procuramos nas férias calma e segurança, mas, se estamos entediados, ansiamos por emoção e aventura.



Mas, ao lado dos efeitos positivos, a viagem encerra também, embora isto seja mais raro, perigos para a psique. Quando não se consegue a adaptação ao ambiente estranho, a conseqüência pode ser uma crise psíquica. No caso dos longos trajetos que envolvem vários fusos horários, pode ocorrer o temido jet lag. O ritmo biológico, o “relógio interior”, é prejudicado. Além do cansaço e dos problemas de insônia, foram observados também casos de ligeira depressão, relata Gregory Katz, da Universidade Hebraica, de Jerusalém. Para as pessoas que já sofrem de transtornos psíquicos, perambular em excesso pelo mundo pode piorar a doença.

Alguns mochileiros descrevem o retorno a casa como altamente deprimente, exprimindo sua vontade de dar as costas para a vida cotidiana, por não estarem mais dispostos (ou não conseguirem mais) a aceitar suas regras e condições. Mas se essa vontade de fuga pode se traduzir em emigração efetiva, logo surgem os problemas. Afinal, também em terras estranhas é preciso ganhar dinheiro, além do que, o mundo vai aos poucos perdendo o ar de novidade, e o paraíso começa a mostrar suas fissuras. Assim, muitas vezes falham as tentativas dos mochileiros de melhorar de modo duradouro a própria condição existencial voltando as costas para o mundo “real”. Entre os que acampam, por outro lado, o percentual de êxito é mais elevado. Muitos deles, de fato, deixam de lado a vida profissional e conseguem mesmo viver no mundo lúdico e de sonho que criaram.

Em suma, tanto em uma viagem de trailer feita com a família e os amigos quanto em uma viagem solitária e de bicicleta à Índia, o princípio básico é o mesmo: a busca do prazer. Se no cotidiano a luta pela vida relega nossos desejos a segundo plano, na viagem de férias ocorre o contrário. A chave para um “lazer bem-sucedido”, parece ser que a viagem compense a realidade banal da vida normal e favoreça o bem-estar. Pelo menos durante esse certo período, criamos um mundo de sonho que compensa as frustrações do cotidiano.

Fonte: http://www2.uol.com.br/vivermente/noticias/ferias_entre_a_aventura_e_o_descanso.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário