segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Dossiê: Tramas de amor e desejo - Imagens de um cérebro apaixonado.

Como foi mostrado aqui, a revista Mente e Cérebro trás para seus leitores uma relação de matérias nas quais o mecanismo da paixão é discutido, principalmente quanto ao aspecto neuropsicológico. Segue abaixo, mais um desses dossiês.

Com ajuda da ressonância magnética funcional, pesquisadores descobriram como o amor subverte nossa vida emocional.
O amor é a espiritualização dos sentidos, dizia a sacerdotisa Diotima a Sócrates. E obviamente tudo que pensamos e sentimos, inclusive o amor, acontece em nossa cabeça. Até recentemente, os pesquisadores do cérebro pouco contribuíram para a compreensão dessa emoção tão especial. Eles estudavam principalmente sensações negativas como medo ou depressão, já que é mais fácil irritar ou assustar voluntários que produzir alegria ou mesmo amor de modo confiável em laboratório. Ainda assim, decidimos dar o primeiro passo para o desbravamento neurocientífico de sensações positivas. Começamos com o amor romântico.

Pedimos a milhares de estudantes de Londres e adjacências que se manifestassem caso se sentissem “truly, madly and deeply”, ou seja, “verdadeira, enlouquecida e profundamente” apaixonados. Recebemos cerca de 70 respostas, três quartos de mulheres. Solicitamos uma breve descrição da relação, fizemos entrevistas e finalmente selecionamos 11 voluntárias e seis voluntários, numa composição multicultural e multiétnica, com 11 nacionalidades diferentes.

Surpreendentemente, nenhum dos participantes acabara de se apaixonar– todos estavam em uma relação mais longa, de dois anos em média, e extremamente satisfatória. Mas a seleção tinha funcionado: ao responder a um questionário psicológico do amor que já tinha sido aplicado a centenas de apaixonados, nossos voluntários atingiram “valores de amor” mais altos que os melhores do estudo anterior. Para maior garantia, fizemos um teste psicológico suplementar que, à semelhança de um detector de mentiras, fundamentava-se na medição da resistência da pele. Quase todos os voluntários começaram a suar diante da foto do parceiro.


CORES DA PAIXÃO: As regiões cerebrais do sistema límbico em amarelo são ativas apenas nos apaixonados que no tomógrafo viram uma foto do parceiro. Os “módulos do amor” estão em meio a quatro estruturas diferentes, sobre cujas funções sabe-se alguma coisa: o córtex cingular ajuda a reconhecer sensações, a ínsula integra a informação dos órgãos sensoriais, enquanto partes do núcleo caudado e do putâmen também estão ativas na excitação sexual.


Analisamos os apaixonados com a tomografia de ressonância magnética funcional, procedimento que torna visível a atividade de várias áreas cerebrais em um determinado momento, com alta resolução espacial. É verdade que o desconfortável tubo do scanner não é exatamente propício à produção de sentimentos amorosos. Mostramos ao voluntário deitado no scanner uma foto da pessoa amada, pedindo que pensasse nela e relaxasse. Como nos relataram, todos puderam sentir claramente seu afeto.

Como medida de controle, os voluntários observaram fotos de três colegas do mesmo sexo e idade que seus parceiros. Além disso, a foto do parceiro não tinha detalhes específicos e um observador de fora não deveria poder diferenciar esta foto das outras. Comparamos a atividade cerebral nas duas situações distintas.

Quatro áreas diferentes, bem pequenas, se iluminavam apenas quando os participantes pensavam carinhosamente nos parceiros. Todas elas se localizavam espelhadas nas duas metades do cérebro no chamado sistema límbico, que controla as emoções em geral. Por sua vez, não encontramos diferenças significativas da atividade no córtex óptico entre a reação às fotos do parceiro e às de colegas. Ao que parece, então, o “cérebro visual” apenas transmite a informação objetiva ao “cérebro emotivo”.


O AMOR NOS TORNA FORTES: Sensações amorosas parecem desativar diversas regiões cerebrais responsáveis por emoções negativas – por exemplo, áreas no lobo frontal anterior direito e partes da amígdala, ativadas em caso de medo, tristeza e agressões.


A imagem da atividade no sistema límbico diferenciava-se claramente de modelos antes encontrados em estudos da emoção no contexto de sensações positivas. No caso das quatro áreas ativadas, trata-se, então, efetivamente de algo como módulos de amor especializados. Provavelmente, cada um deles tem uma função específica, sobre a qual por ora podemos apenas especular. Assim, por exemplo, drogas estimulantes como a cocaína ativam áreas bem mais extensas no ser humano, incluindo os quatro módulos do amor que identificamos. Pode-se concluir que o amor representa apenas uma parte dos estados eufóricos, do ponto de vista não apenas psicológico, mas também neuronal.

Além disso, essas zonas distinguem o amor da pura excitação sexual. Com efeito, o desejo estimula regiões do hipotálamo que nas nossas experiências ficavam inativas. Por outro lado, o amor sensual parece ativar o núcleo caudado e o putâmen, regiões onde estão dois de nossos módulos do amor. Talvez eles tragam o elemento erótico para o amor romântico.

O terceiro módulo do amor está localizado no córtex cingular anterior, estrutura que nos ajuda a reconhecer nossos sentimentos e os do parceiro, capacidade certamente essencial para o amor. O quarto módulo, por fim, é uma parte da ínsula, situada no interior do diencéfalo e que tem diversas funções. Sua atividade aumenta quanto mais atraentes forem os rostos apresentados. Aparentemente, essa estrutura integra a percepção visual ao mundo emocional. Além disso, parece receber informações da região estomacal: talvez o “frio” na barriga faça uma parada na ínsula, antes de encontrar o caminho até a consciência.



Não surpreende que centros cerebrais tão pequenos provoquem uma sensação tão poderosa e inspiradora como o amor? Estudos anatômicos mostraram que os pequenos módulos do amor estão ligados a quase todas as regiões do cérebro. Ao que parece, no entanto, essas ligações são utilizadas de modo diverso por cada um de nós. É o que torna o amor único!

Uma emoção tão complexa como o amor não exige apenas uma atividade cerebral única, mas também um equilíbrio sutil entre regiões ativadas e desativadas. Em nossos experimentos, descobrimos várias áreas desativadas, principalmente na metade direita do cérebro: todas estavam associadas a sensações negativas. Partes da amígdala, por exemplo, que é estimulada em situações de tristeza, medo e agressão. Aparentemente, sensações amorosas conseguem subjugar essas regiões cerebrais.

Como pesquisadores do cérebro, podemos afirmar que o amor não traz apenas felicidade, mas também nos torna corajosos e dóceis. Em nossos voluntários, aliás, o lobo frontal anterior direito estava praticamente desativado, sendo muito ativo no caso de pessoas depressivas ou tristes. Terapias em que a atividade dessa região é amortecida com fortes pulsos magnéticos estão beneficiando pessoas com depressão profunda. Em muitos casos, o amor seria uma ótima opção de tratamento, mas infelizmente ele não é prescrito sob encomenda.

Fonte: http://www2.uol.com.br/vivermente/dossie/imagens_de_um_cerebro_apaixonado.html

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